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Angústias sobre a implementação da nova lei florestal (Texto 1)

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Raul Silva Telles do Valle, coordenador de Política e Direito Socioambiental do ISA

Em maio último, o texto principal da nova lei florestal (Lei Federal 12.651/2012) completou um ano de vigência. Para quem não acompanhou detidamente toda a novela que resultou na aprovação da lei, em resumo ela já nasceu remendada, pois veio ao mundo junto com uma Medida Provisória, que modificava diversos de seus pontos e foi finalmente convertida em lei em outubro do ano passado (Lei Federal 12.727/2012). Portanto, se considerarmos que a lei tornou-se “completa” nessa data, podemos afirmar que está prestes a completar um ano.

De lá pra cá, o país vive em compasso de espera: quem estava reflorestando, parou; quem ia começar, adiou; quem queria voltar a desmatar, sentiu-se estimulado e foi em frente. Todos estão, por razões diversas, aguardando a chegada dos planos de regularização ambiental (PRAs). Para muitos, eles serão a “cura de todos os males”, na medida em que – assim esperam – regularizarão o uso de áreas que antes deveriam ser protegidas. Com isso acabam-se as multas e a obrigação de recuperação, ou seja, todos os custos derivados de desmatamentos irregulares do passado.

A questão é que ninguém sabe exatamente o que são ou devem ser esses programas. Na verdade, há interpretações bastante diversas entre si e que estão disputando a hegemonia.

À época da aprovação da lei, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e seus parlamentares defenderam que cada estado tivesse seu próprio programa (saiba mais) para que pudessem avaliar, quase que caso a caso, o que deveria ou não ser protegido, vis a vis as condições topográficas, climáticas, ambientais e econômicas de cada lugar, acabando com as “linhas burras” da lei federal, a qual definia uma mesma medida para todo o país. Agora, defendem o contrário. A pressão da CNA e de suas federações estaduais é para que os PRAs sejam meros processos burocráticos de validação das anistias concedidas pela lei federal, de forma que ninguém se veja obrigado a preservar ou recuperar um centímetro a mais do que o mínimo exigido em nível nacional (veja aqui). Agora que estão em vantagem, mudaram de tática e passaram a ser defensores da linha burra. Para eles, os PRAs serão simples regulamentos que dirão como o produtor pode se ver livre da obrigação de ter de recuperar a vegetação no entorno de uma nascente ou um rio. Nas palavras de um amigo, “um passaporte para a anistia”.

A outra interpretação, à qual me filio, é a de que o PRA deve ser realmente um programa ambiental, como dito na lei e defendido à exaustão por seus defensores há menos de dois anos. Isso significa que ele deve ter como objetivo a melhoria do meio ambiente, e não legitimação de passivos ambientais. Deve, além disso, ter metas, indicadores e, principalmente, meios para atingir seus objetivos. Ou seja, em vez de dizer qual o formulário que o produtor deve preencher para ter direito à anistia, os programas deveriam criar critérios para definir quais áreas não podem deixar de ser recuperadas e trazer políticas eficientes que induzam e apoiem os produtores a fazê-lo. Questões como assistência técnica, produção e distribuição de sementes, desoneração tributária da cadeia da restauração florestal, linhas de financiamento, incentivos econômicos à conservação e pagamento por serviços ambientais deveriam fazer parte dos PRAs.

Como era de se esperar, a maioria dos estados está enveredando pela primeira opção, que é a mais simples e livre de ônus político imediato. É o caso do Mato Grosso, que ainda não elaborou o seu programa, mas, ao que tudo indica, simplesmente editará uma lei ou um decreto repetindo aquilo que está na lei federal.

Por pressão da sociedade civil, o Ministério do Meio Ambiente criou um Grupo de Trabalho de Acompanhamento da Implementação do Código Florestal para monitorar e opinar sobre o processo de implementação da lei. Seu objetivo será avaliar como cada estado e a União estão desenvolvendo seus sistemas de cadastro ambiental rural (CAR) e programas de regularização ambiental. Já houve duas reuniões desse GT, com resultados interessantes e que mostram como a situação ainda está bastante bagunçada. Voltarei ao assunto nos próximos posts.

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