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Rio Negro debate educação escolar indígena e Território Etnoeducacional

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A Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) em parceria com o ISA, com apoio da Fundação Nacional do Índio (Funai), realizaram o seminário de Educação Indígena e o encontro do Território Etnoeducacional do Rio Negro, em São Gabriel da Cachoeira, noroeste amazônico de 2 a 6 de junho.

Cerca de 350 professores e lideranças indígenas das comunidades localizadas nos municípios de Barcelos, Santa Isabel do Rio Negro e São Gabriel da Cachoeira, participaram do evento denominado “Nossas experiências e lições aprendidas para políticas públicas - Agenda estratégica para as próximas décadas”. Também marcaram presença representantes de instituições governamentais caso da Coordenação Geral de Educação Escolar Indígena, do Ministério da Educação; da Secretaria Estadual de Educação do Amazonas; da Secretaria Municipal de Educação de São Gabriel da Cachoeira; do Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena; da Coordenação Geral de Índios Isolados e Recém Contatados (Funai) e da Coordenação Geral de Promoção da Cidadania (Funai).

Como parceiro da Foirn, o Instituto Socioambiental participou por meio de seus representantes do Programa Rio Negro, Rio Branco e Xingu, tendo como convidado Karim Juruna, representante da Associação da Terra Indígena do Xingu (Atix). Participou também o Observatório de Educação Escolar Indígena da Universidade Federal de São Carlos (Ufscar).

Propostas de seminários regionais foram sistematizadas

Os três primeiros dias de discussão tiveram como base o contexto e os diagnósticos apresentados a partir dos seminários regionais de educação escolar indígena realizados nos municípios de Santa Isabel e em Barcelos e em comunidades indígenas do Alto Rio Negro como Itapereira (Médio Rio Negro); Tunui Cachoeira (Rio Içana); Taracuá Distrito (Médio Uaupés); Iauaretê (Alto Uaupés); Táwa (São Gabriel da Cachoeira) e povos Hupd’äh e Yuhupd’ëh (Rio Papuri, Igarapé Japu e Rio Tiquié).

Entre apresentações e palestras, as discussões em torno da educação indígena e as propostas das escolas indígenas, adequadas aos 31 grupos étnicos do Rio Negro, foram sistematizadas. Ao longo do evento, um Termo de Cooperação Interinstitucional e a atualização do Plano de Ação do Território Etnoeducacional do Rio Negro foram redigidos, discutidos e revisados por plenária e assinados no encerramento.

No decorrer do evento, a Foirn organizou textos diários sobre o seminário, fotos, entrevistas e textos inéditos de lideranças indígenas. O material completo está disponível no blog da Foirn.

A abertura contou com a palestra de André Fernando, liderança Baniwa, onde a distância entre a lei vigente e a prática do dia a dia ficou evidenciada. Outros relatos ao longo do dia bateram na mesma tecla e resumem um dos grandes problemas apontados: a falta de implementação de direitos garantidos pela Constituição, a Lei de diretrizes e bases e Resoluções como a 03/1996. Se não faltam leis, falta ação. Ao final da abertura, os alunos do ensino fundamental e médio da escola Tuyuka Utapinopona apresentaram danças de cariçu e japurutu.

No primeiro dia, representantes das coordenadorias regionais da Foirn apresentaram um resumo dos principais problemas e propostas, discutidos e sistematizados a partir dos grupos de trabalhos constituídos nos seminários regionais, relacionados com a estrutura física, merenda e transporte escolar, material didático, formação de professores indígenas, níveis de ensino das escolas nas comunidades e Projetos Políticos Pedagógicos Indígenas.


Estrutura precária foi um dos problemas apontados

Alguns pontos destacados foram a estrutura precária, a falta de formação continuada dos professores, processo seletivo com padrões exteriores à região, falta de material didático produzido pelas próprias comunidades e em línguas indígenas, falta de reconhecimento dos Projetos Políticos Pedagógicos Indígenas pelo governo e problemas com a qualidade e distribuição da merenda escolar.

À tarde, uma roda de conversa entre representantes da Foirn, Funai, Ifam, ISA, MEC, Semec/SGC, Seduc e Seind discutiu os desafios da educação escolar indígena, levando em consideração os pontos levantados nas apresentações da manhã. Os participantes levantaram questões e apresentaram suas demandas e propostas aos representantes do poder público. Entre as propostas, alternativas para questões como construção de escolas por meio de mutirões comunitários, produção e venda de merenda regionalizada, Projetos Políticos Pedagógicos próprios, formação continuada e protagonismo dos povos indígenas.

No segundo dia, as mais de 300 pessoas que lotaram a maloca da Foirn participaram de duas rodas de conversa, com apresentações e espaço para debater com os palestrantes.O coordenador da escola Yupuri, Vicente Villas-Boas Azevedo, que elaborou Projeto Político Pedagógico próprio e trabalha com as comunidades do Médio Rio Tiquié, ressaltou que apesar de o diálogo entre o Estado e comunidades indígenas ser um aspecto de grande importância para o desenvolvimento da educação escolar indígena, prevalece a lógica da tutela frente aos povos indígenas, levando-os para a margem da sociedade por não atender seus interesses e impor receio à participação indígena.

Experiências bem sucedidas de escolas piloto foram apresentadas

O processo de criação das escolas piloto desenvolvidas pela parceria Foirn-ISA foi lembrado. Criadas por conta de demandas das comunidades as escolas foram estabelecidas com o intuito de valorizar a diversidade, adotando a pesquisa como metodologia. Essa foi a marca de escolas como a Utapinopona dos Tuyuka, a Kumuno Wu’ú dos Kotiria, a Yupuri dos Tukano e a escola Pamáali dos Baniwa. O objetivo é privilegiar a qualidade de ensino e não somente o cumprimento de regras burocráticas. O que vale é o bem viver das comunidades, que traz para a realidade da educação escolar diferentes conceitos de pesquisa e de ensino, sempre em um processo de atualização e transformação. Tal fluidez, tão importante para acompanhar os anseios das comunidades, é mal compreendida pelas normas vigentes do Estado.

Entre os relatos de realidades locais feitos pelos participantes, destacam-se: o desajuste das políticas públicas para atender a realidade logística e de estrutura de gestão no Rio Negro; a cobrança de acordos já feitos com gestores públicos sobre estrutura física e contratação de recursos humanos; a falta de métodos adequados de avaliação escolar; a necessidade de se processar o governo e acionar o Ministério Público Federal diante de tantos casos de omissão; a necessidade de o Estado respeitar os povos indígenas; a falta de capacidade de operacionalização da Secretaria de Educação do Amazonas (admitida pelo próprio representante local); a inclusão de conhecedores como pajés, kumu e baya nas ações das escolas e de gestão territorial junto aos alunos recém formados de cursos como agroecologia e turismo; problemas para liberar materiais didáticos essenciais às escolas indígenas no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), pois não se encaixam dentro de seus pacotes; o longo processo a ser empreendido para que o Território Etnoeducacional vire uma unidade gestora; e a falta de definição do Estado de uma política lingüística para as escolas indígenas.


A experiência do Xingu

No terceiro dia, uma roda de conversa formada por indígenas, entre lideranças, professores e coordenadores contou com uma exposição de Karim Juruna, da etnia Yudjá e liderança da Atix (Associação da Terra Indígena do Xingu). Ele apresentou alguns dos trabalhos que valorizam a cultura, reflorestam o território e unem as comunidades para enfrentar pressões como plantações de soja, criação de gado e grandes obras de infraestrutura, caso da hidrelétrica de Belo Monte. Apesar de o Parque do Xingu ter 28 municípios ao seu redor, somente sete deles atendem escolas indígenas. Para os participantes foi uma oportunidade de conhecer um contexto bastante diferente, principalmente no tocante à pressão pelo território, mas que tem similaridades como as atividades que fortalecem o poder e autonomia indígena.

Em seguida, gestores das escolas de Taracuá, no Rio Uaupés e de Pari-Cachoeira, no Rio Tiquié expuseram como o sistema convencional de educação está enraizado em ideias do dia a dia e como vários pais são resistentes à educação indígena. De acordo com os expositores, temas como a colonização, seja externa ou de indígena para indígena e a valorização das identidades próprias de cada grupo podem trazer fortes contrapontos aos entraves para a educação indígena.

O seminário se encerrou com uma exposição do Observatório da Educação Escolar Indígena da Universidade Federal de São Carlos, que busca pesquisar, por meio de etnografias de escolas indígenas questões como o respeito aos conhecimentos indígenas, a comparação entre escolas diferenciadas e não diferenciadas, a infância indígena e as práticas pedagógicas. Depois, participantes e representantes governamentais trabalharam em cima do documento de encaminhamentos e propostas, disponível acima.

Nos dias 5 e 6, os debates foram sobre o Território Etnoeducacional do Rio Negro. O plano de ação, elaborado em 2009, foi revisado e atualizado pelos indígenas presentes, junto aos representantes institucionais que expuseram, instituição por instituição, suas linhas de ação e debateram com os participantes as ações propostas.

O encerramento contou com a assinatura por parte dos representantes institucionais dos documentos elaborados ao longo do seminário e a entrega dos diagnósticos impressos de todos os seminários locais para estes representantes. Finalmente, a Casa os alunos da escola Tuyuka Utapinopona encerraram o evento com cantos, danças e adornos cerimoniais.

Veja aqui a programação do seminário.
doc_2_teern1.pdf doc_1_documento_final_do_seminaurio.pdf

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