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Após três décadas de luta, TI Cachoeira Seca do Iriri é homologada

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A assinatura do decreto por Dilma Rousseff é uma das principais condicionantes da Usina Hidrelétrica de Belo Monte
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Na primeira semana de abril, uma das terras indígenas do povo Arara finalmente teve seu processo de demarcação concluído. Publicada no Diário Oficial, a homologação da Terra Indígena Cachoeira Seca do Iriri, no Pará, com 788.633 hectares, reconhecida como de posse dos Arara pela Presidência da República é uma vitória da comunidade que esperou mais de 30 anos pela demarcação da área.

A homologação é uma das mais importantes condicionantes para o licenciamento da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, e deveria ter sido efetivada antes do início das obras, seis anos atrás. Ainda assim, a notícia é recebida com alegria pelos Arara: “A nossa luta pela demarcação da nossa terra não é de hoje. A gente brigou, lutou por tudo isso. É bom ver a nossa vitória”, comemora o cacique Mobu-Odo.

A TI faz parte de um mosaico de áreas protegidas da Terra do Meio, situado entre os rios Iriri e Xingu, na Terra do Meio, (PA), e é alvo de conflitos desde a década de 1970. Esse conjunto resguarda uma das maiores biodiversidades da Amazônia, além de ser um muro de contenção à expansão do desmatamento - que se alastra do Mato Grosso ao Amazonas. O crescimento dos índices de desmatamento e invasões preocupa as comunidades locais e organizações parceiras. No período entre 2014 e 2015, houve um aumento de 41% em toda a Terra do Meio.

A região foi sistematicamente saqueada por madeireiros e hoje é uma das mais desmatadas do país. Segundo estudo realizado pelo ISA, entre 2014 e 2015, o desmatamento na TI Cachoeira Seca aumentou 73% e a extensão das estradas de madeireiros ilegais, 48%, contabilizando mais de 43 mil hectares desmatados e mil quilômetros de rodovias madeireiras no total. Calcula-se que apenas no ano de 2014 foram movimentados R$ 200 milhões em vendas ilegais de madeira. (Saiba mais na publicação Rotas do Saque).

30 anos de luta

Em 1972, a construção de um trecho da Transamazônica cortou ao meio o território dos Arara, que até então viviam em isolamento voluntário, fazendo com que a região fosse invadida por colonos, garimpeiros e madeireiros ilegais. Além de terem seu território drasticamente reduzido, os Arara sofreram com conflitos, mortes, desagregação social dos subgrupos e desestabilização da sua vida produtiva - caso que foi registrado como grave violação de direito humano pelo Relatório da Comissão Nacional da Verdade, em 2014. (Leia a íntegra do documento).

Uma Frente de Atração foi instituída ainda nos anos 1970 e os primeiros grupos foram contatados quase uma década depois, entre 1981 e 1984. Apenas em 1987 a comunidade que hoje vive na TI Cachoeira Seca foi oficialmente contatada. Nesse meio tempo, os estudos de identificação das áreas foram avançando, ainda que de forma lenta por conta dos conflitos na região. Uma delas, a TI Arara foi identificada em 1978 e homologada em 1991.

Já a área que viria a ser a TI Cachoeira Seca, mais intensamente invadida, foi interditada para estudos em 1985 e homologada mais de 30 anos depois, tornando esse processo de demarcação um dos mais longos da história. Essa é a única Terra Indígena cuja regularização fundiária foi iniciada antes da promulgação da Constituição Federal de 1988 e ainda não tinha sido homologada.

O antropólogo Márnio Teixeira Pinto, que trabalha com os Arara desde a década de 1980, vê na recente homologação uma vitória para o povo Arara: “Gostaria de pensar que toda essa demora ocorrida, com suas idas e vindas, grupos e mais grupos de trabalho, tentativas e frustrações que agora ficam pra trás, possa ser interpretada como evidência da extrema importância de todo este longo processo de resguardar a área para eles”.

Confira aqui a linha do tempo com as principais manchetes publicadas pela imprensa sobre o caso desde os anos 1980

Desintrusão

“A homologação ainda não e o fim [do processo de regularização fundiária], agora estamos esperando a desintrusão. Mas a terra já está garantida pra nossa comunidade”, reforça Mobu-Odo. De acordo com levantamento da Funai, foram identificadas 1.085 ocupações de não indígenas no interior da área, sendo 72% de pequenas propriedades. O próximo passo é encaminhar a saída gradativa e o reassentamento dos ocupantes, em sua maioria posseiros de boa fé, e entre os quais há um pequeno grupo de beiradeiros, comunidade que assim como os Arara depende dos recursos da floresta e para a qual será necessário um tratamento diferenciado de realocação para garantir seus direitos.

A retirada e a realocação das famílias que vivem na TI Cachoeira Seca também é uma das condicionantes de Belo Monte que deveria ter sido cumprida antes do início das obras, assim como a retirada de invasores da TI Apyterewa e a implantação de postos de vigilância nas TIs afetadas pela hidrelétrica - dois deles na TI Cachoeira Seca.

Segundo Márnio, a terra homologada agora, nas proximidades da TI Arara, pode garantir a oportunidade de uma vida comum a todos os grupos: “Um horizonte melhor para eles passará necessariamente pela possibilidade de que, num futuro próximo, encontrem na base material de suas vidas a condição de exercerem seu direito à diferença, retomando aspectos de sua própria tradição cultural como alavanca para um projeto de futuro”.

Isabel Harari com colaboração de Tatiane Klein
ISA
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