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Desmatamento avança sobre Terras Indígenas impactadas por Belo Monte

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Em apenas dois meses, entre setembro e outubro, 5,4 mil hectares foram desmatados nas Terras Indígenas Cachoeira Seca, Apyterewa, Ituna Itatá e Trincheira Bacajá, no Pará. Localizadas na área de influência da hidrelétrica de Belo Monte, as quatro TIs lideram o ranking das mais desmatadas na Amazônia, segundo dados do Prodes. [Saiba mais no box abaixo]

A estruturação de um plano de proteção territorial e regularização fundiária são condicionantes que deveriam anteceder a construção da usina, em 2011, e até hoje não se concretizaram. Cinco anos após a Licença de Operação, indígenas denunciam aumento de invasões de seus territórios, agravadas pelo avanço da pandemia de Covid-19. “Exigimos que as ações de monitoramento, fiscalização e proteção sejam retomadas. A floresta não importa apenas para nós povos indígenas, ela importa para todas as pessoas do planeta”, diz manifesto assinado pelos povos Parakanã, Arara e Xikrin em 24 de novembro. [Leia na íntegra].

A TI Apyterewa, dos Parakanã, concentrou 51% do desmatamento em TIs na bacia do Xingu entre setembro e outubro. As invasões têm sido impulsionadas por um esquema de grilagem de terras em que novos invasores são instalados irregularmente por grileiros da região no interior da TI, e duas frentes de garimpo em atividade intensificam a pressão sobre o território.


O desmatamento na Apyterewa explodiu após o cancelamento das ações de fiscalização do Ibama, que vinham combatendo a destruição da floresta até maio deste ano. Houve um aumento de 393% no mês seguinte à suspensão das operações, que continuou crescendo ininterruptamente até novembro, quando foram retomadas operações do Ibama dentro da TI. Entre julho e agosto foram desmatados 1,2 mil hectares, e mais 3,2 mil foram desmatados em setembro e outubro, segundo dados do Sirad X.

Localizada na área de influência de Belo Monte, a TI Apyterewa enfrentou o recrudescimento da pressão em 2018, quando foram desmatados 1,8 mil hectares, 334% mais do que no ano anterior. Em 2019, o número quadruplicou, atingindo a marca de 8,6 mil hectares.


Assim como na Apyterewa, o desmatamento na TI Trincheira Bacajá explodiu após o fim das operações do Ibama. De 3 hectares desmatados em maio, o desmatamento pulou para 640 hectares em outubro. À revelia do pedido da retirada dos invasores na TI, uma das medidas emergenciais
solicitadas na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) apresentada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) ao Supremo Tribunal Federal, o desmatamento segue crescendo: foram desmatados 1,2 mil hectares entre setembro e outubro, um aumento de 84% em relação ao bimestre anterior. [Saiba mais]

“Queremos respostas, queremos saber porque a Operação Verde Brasil 2, que começou em maio deste ano, não tem impedido a continuidade das ações ilegais nos nossos territórios. O que tem sido feito para proteger as nossas florestas e as nossas famílias?”, pedem os indígenas na carta.

No texto, os indígenas exigem medidas efetivas para conter as ameaças aos seu territórios, como a retirada dos invasores, instalação de barreiras nas entradas das Áreas Protegidas, a apreensão do gado ilegal, a destruição das construções e a apreensão dos equipamentos utilizados nas atividades ilegais.

Os dados são do 21º boletim Sirad X, o sistema de monitoramento de desmatamento da Rede Xingu +, uma articulação de indígenas, ribeirinhos e parceiros da bacia do Xingu.

Dívida de Belo Monte

A regularização fundiária das TIs na área de influência de Belo Monte e a implementação do Plano de Proteção Territorial são dívidas antigas da hidrelétrica, que deveriam ter sido quitadas antes da instalação da usina, em 2011. À revelia da determinação, a Licença de Operação foi concedida em 2015. A ausência de medidas de proteção territorial indígena explicam parte das crescentes ameaças e pressões nos territórios.

A proteção das TIs contra as pressões era ação prioritária no desenho das condicionantes e dos programas socioambientais. [Leia Nota Técnica do ISA na íntegra]

“Hoje o que vemos é o contrário do que havia sido prometido: grande aumento de movimentos organizados de invasores que nos ameaçam e ameaçam nossas famílias. Os invasores são motivados por promessas do governo para diminuição dos nossos territórios tradicionais e pela diminuição das ações de fiscalização”, dizem os indígenas na carta enviada para o Ministério Público Federal em novembro.


A emissão da Licença de Operação foi viabilizada mediante a assinatura de um Termo de Cooperação entre a Norte Energia, concessionária da usina, e a Funai para a implementação do Plano de Proteção Territorial das Terras Indígenas impactadas por Belo Monte. Cinco anos depois, e mesmo após ser judicializado pelo MPF, o plano segue incompleto: das oito Unidades de Proteção Territorial acordadas, três ainda sequer foram construídas.

Duas delas, a Base Operativa Cachoeira Seca e o Posto de Vigilância Rio das Pedras deveriam ter sido implementadas na TI Cachoeira Seca, que lidera o ranking de desmatamento há seis anos (Prodes). A outra, um posto de vigilância, deveria ser construído na TI Ituna Itatá, que também figura entre as TIs mais desmatadas da Amazônia. Nestas duas Terras Indígenas, nenhuma base começou a ser construída ainda.

Desde 2015 a empresa justifica que não avançou nas obras pois não consegue garantir a segurança dos funcionários. Em resposta a um pedido de acesso à informação feito pelo ISA, a Funai afirmou que “tem reiteradamente cobrado agilidade no processo, tendo viabilizado suporte de segurança por parte de forças oficiais de segurança pública, todavia a Norte Energia ainda não apresentou cronograma de construção das obras pendentes” [Leia na íntegra]. Até o fechamento do texto, no entanto, a Norte Energia não apresentou um cronograma de construção das obras pendentes.

No início de novembro, a Justiça Federal da 1ª Região ordenou que a União e Funai concluam os processos de regularização fundiária das TIs Paquiçamba e Cachoeira Seca, no Pará. Os órgãos têm 90 dias para apresentar um cronograma de trabalho, que inclui a demarcação, homologação e desintrusão dos territórios. Caso haja o descumprimento dos prazos, o governo deve pagar uma multa de R$ 10 mil reais a cada dia de atraso. [Saiba mais]



Pressão aumenta em Unidades de Conservação

Mais de 12 mil ha foram desmatados em Unidades de Conservação em setembro e outubro, um aumento de 37% em relação aos dois meses anteriores. A Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu, no Pará, concentrou três quartos de todo o desmatamento, com 9,5 mil hectares de floresta destruídos no período. Mesmo com histórico de grilagem, a APA segue sem plano de manejo e sem áreas definidas como prioritárias para a conservação.


Pelo 12º ano consecutivo a APA lidera o ranking das UCs mais desmatadas no Brasil, segundo o Prodes, com 43,86 mil hectares de floresta destruídos. O desmatamento pressiona as Áreas Protegidas vizinhas como a Estação Ecológica (Esec) Terra do Meio e o Parque Nacional (Parna) Serra do Pardo, ambas Unidades de Conservação de Proteção Integral de responsabilidade do governo federal.


Na rasteira da APA Triunfo do Xingu, as três UCs mais desmatadas no período estão localizadas na área de influência da BR-163, que já se consolidou como um vetor de pressão sobre as Áreas Protegidas. A Floresta Nacional (Flona) de Altamira, a Reserva Biológica (Rebio) Nascentes da Serra do Cachimbo e a Floresta Estadual (Fes) do Iriri, localizadas no entorno da estrada, contabilizaram 1 mil hectares, 670 hectares e 403 hectares desmatados entre setembro e outubro, respectivamente.

Bacia do Xingu lidera ranking de desmatamento

A bacia do Xingu concentrou as quatro Terras Indígenas mais desmatadas na Amazônia e a Unidade de Conservação mais desmatada no Brasil pelo 12º ano seguido, a APA Triunfo do Xingu. Os dados são do Programa Monitoramento do Desmatamento da Floresta Amazônica Brasileira por Satélite (Prodes) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e correspondem ao período entre agosto de 2019 e julho de 2020. [Saiba mais]

Na bacia, o desmatamento pulou de 227 mil para 255 mil hectares em 2020. Desse total, 74% ocorreu na porção paraense da bacia, que também incide sobre o estado do Mato Grosso. Mais da metade do desmatamento ocorreu em áreas fora de Unidades de Conservação, Terras Indígenas e Assentamentos rurais

O desmatamento em TIs no Xingu aumentou em 12,5% comparado com o último período. A TI Cachoeira Seca liderou o ranking com 7,3 mil hectares desmatados, seguida pela TI Apyterewa (6,3 mil ha), Ituna/Itatá (6,2 mil ha) e Trincheira/Bacajá (2,3 mil ha). A TI Kayapó, que contabilizou 1,6 mil hectares de floresta destruídos, ficou em sexto lugar na lista, atrás da TI Mundurucu, localizada na bacia do Tapajós.

A campeã APA Triunfo do Xingu desmatou mais de 43 mil hectares desmatados, equivalente a área urbana de Manaus, capital amazonense. Dentre as 13 UCs mapeadas no Xingu, oito apresentaram aumento nas taxas de desmatamento: o desmatamento na Floresta Estadual do Iriri e a Floresta Nacional de Altamira cresceu 331% e 196%, respectivamente.


Isabel Harari
ISA
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