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Exposição no IMS apresenta obra de Claudia Andujar dedicada aos Yanomami

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A mostra reúne mais de 300 fotografias, desenhos, uma instalação e documentos da fotógrafa, que dedicou boa parte de sua vida ao estudo e proteção de um povo indígena ameaçado de extinção
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A partir de 15 de dezembro, o Instituto Moreira Salles (IMS)Paulista exibe a exposição retrospectiva "Claudia Andujar – A luta Yanomami". A mostra ocupa dois andares do centro cultural e é uma das maiores já feitas pela instituição. Reúne cerca de 300 obras e uma instalação da fotógrafa e ativista, além de livros e documentos.

O conjunto traça um panorama do trabalho de Andujar dedicado aos Yanomami, retomando aspectos pouco conhecidos de sua trajetória e da sua luta pela demarcação de Terras Indígenas, numa união entre arte e política. A seleção é resultado de pesquisa de muitos anos no acervo de mais de 40 mil imagens de Andujar realizada pelo curador Thyago Nogueira, coordenador da área de fotografia contemporânea do IMS.

"Claudia Andujar – A luta Yanomami" teve apoio e consultoria do Instituto Socioambiental (ISA) e colaboração da Hutukara Associação Yanomami (HAY). Na abertura, dia 15 de dezembro(sábado), às 11h, a artista participa de uma conversa com o curador da exposição e com o líder indígena Davi Kopenawa, no auditório do IMS Paulista. A programação da mostra também inclui, no dia 16 de dezembro (domingo) às 11h, um ritual xamânico conduzido por Kopenawa.

Claudia Andujar (1931) cresceu na Europa, na região da Transilvânia, de onde escapou para a Suíça durante a Segunda Guerra Mundial. Sua família paterna, de origem judaica, foi morta nos campos de concentração de Auschwitz e Dachau. Emigrou da Suíça para os Estados Unidos e depois para o Brasil, em 1955. Aqui, começou a fotografar e construiu uma carreira bem-sucedida no jornalismo. Em 1971, aos 40 anos, registrou os Yanomami pela primeira vez para a revista Realidade. O encontro mudou a vida da fotógrafa, que voltou inúmeras vezes ao território para documentar aquela cultura ainda relativamente isolada.

O primeiro andar apresenta a fase inicial de sua carreira, com fotografias produzidas entre 1971 e 1977, na região do Catrimani, em Roraima. Andujar acompanhou as atividades diárias na floresta e na maloca, os rituais xamânicos e retratou os indivíduos. O mergulho entre os Yanomami foi possível graças a uma bolsa da Fundação John Simon Guggenheim. Segundo o curador Thyago Nogueira, “os anos de dedicação profunda fizeram com que Andujar transformasse o interesse jornalístico e antropológico em uma interpretação radicalmente original da cultura, feita com imagens”.

Nessa parte da exposição, é possível acompanhar as primeiras viagens de Andujar ao território Yanomami, sua aproximação com a nova cultura e o amadurecimento do trabalho, conforme passava mais tempo na floresta. Com a ajuda do missionário Carlo Zacquini, que vivia há muito entre os Yanomami, Andujar pode aprofundar-se na rotina, acompanhar viagens, festas e expedições de caça: “É claro que cortar um animal é algo sangrento, mas, não sei, acho que já me acostumei com isso, não me choca mais e nem acho estranho. É o jeito que as coisas são. Para falar a verdade, estou há tanto tempo com os índios que não acho mais nada estranho. Sempre olho e tento entender. As coisas são do jeito que são”, descreve em um áudio gravado em plena mata.



Um dos conjuntos mais impactantes do período é o registro das festas reahu, as complexas cerimônias funerárias e de aliança intercomunitária, marcadas por ritos específicos e pela fartura de comida. Para produzir as fotos, tentando relacionar o que via com a dimensão mística presente nos rituais, Andujar desenvolveu experimentos fotográficos em São Paulo, com flashes, lamparinas e filmes infravermelhos, que depois aplicou na mata. As imagens traduzem o universo espiritual, dando forma concreta a um mundo abstrato. “Ao interpretar com imagens, e não palavras, como faziam a antropologia e o jornalismo, Andujar também oferecia uma nova camada de significados”, afirma Nogueira.

Entre 1974 e 1976, Andujar ainda produziu centenas de retratos dos Yanomami que conheceu, formando um conjunto de rostos de crianças, jovens e adultos emergindo de um fundo negro. O conjunto, presente na mostra em 48 retratos, revela fisionomias e elementos culturais, como a tanga feminina ou o cordão cintural dos rapazes. As fotos foram feitas utilizando apenas a luz natural que penetrava nas malocas, e cada sessão consumiu um filme inteiro, medida necessária para criar intimidade.

Depois de algum tempo, a aproximação com os Yanomami também levou a fotógrafa a propor que eles próprios representassem seu universo. Em 1974, com a ajuda de Zacquini, levou ao Catrimani papéis e canetas hidrográficas e deu início a um projeto de desenho, dois anos depois ampliado com uma bolsa da Fapesp. Cerca de 30 desenhos originais de mitos e cenas do cotidiano Yanomami serão apresentados na mostra.

Expulsão e demarcação

Em 1977, Andujar foi expulsa e impedida de voltar à área indígena pela Fundação Nacional do Índio (Funai). O segundo andar da exposição foca no contato radical da civilização branca com a indígena e na história de luta empreendida pela fotógrafa para proteger o povo que adotara como família. Entre os anos 1970 e 1980, o garimpo e os planos de desenvolvimento da Amazônia durante o governo militar introduziram um rastro de doenças, violência e poluição que aniquilou comunidades indígenas inteiras, despreparadas para enfrentá-lo.

Diante da tragédia, Andujar cria com o missionário Carlo Zacquini e o antropólogo Bruce Albert a Comissão pela Criação do Parque Yanomami (CCPY) em 1978. Durante 13 anos a CCPY travou uma batalha incansável pela demarcação contínua da Terra Indígena Yanomami, vista como a única maneira de garantir a sobrevivência dos Yanomami e seu ecossistema. Contra forças econômicas poderosas, finalmente, em 1992, a terra foi homologada às vésperas da conferência-geral da ONU sobre o clima (Rio-92), num dos mais bem-sucedidos exemplos de luta política.

Durante a campanha, Andujar mobilizou organização nacional e estrangeira, levantou fundos, escreveu manifestos e correu o mundo para denunciar o descalabro. Sua fotografia passou a instrumentalizar a mobilização política. Também desenvolveu programas de saúde e educação, com os quais percorreu toda a extensão da terra indígena.

Em uma de suas séries mais conhecidas, fotografou Yanomami de várias regiões para identificar os cadastros de saúde e vacinação. As fotos numeradas se transformaram na série Marcados, exibidas na 27a Bienal de Arte de São Paulo e no exterior. A exposição apresenta novos conjuntos dessa série, com uma contextualização sobre os lugares onde os retratos foram feitos.

Esses retratos numerados evocam momentos sombrios da história do século xx, como o Holocausto, associado à trajetória da própria artista. “Criamos uma nova identidade para eles, sem dúvida, um sistema alheio a sua cultura. São as circunstâncias desse trabalho que pretendo mostrar por meio destas imagens feitas na época. Não se trata de justificar a marca colocada em seu peito, mas de explicitar que ela se refere a um terreno sensível, ambíguo, que pode suscitar constrangimento e dor”, afirma a fotógrafa.



Outro destaque é uma nova versão da instalação Genocídio do Yanomami: morte do Brasil (1989/ 2018), manifesto audiovisual em 16 telas, criado em defesa dos Yanomami. A instalação foi exibida pela primeira vez em 1989 como reação aos decretos assinados pelo presidente da República, José Sarney, que demarcavam a terra indígena em 19 “ilhas” isoladas. Feita com fotos do arquivo de Andujar refotografadas com luzes e filtros, a projeção conduz o espectador por um mundo em harmonia, paulatinamente destruído pelo progresso da civilização branca. A compositora Marlui Miranda criou a trilha, que combina música instrumental americana, japonesa e cantos Yanomami. A instalação apresenta uma retrospectiva do trabalho de Andujar, incluindo fotos tiradas entre 1972 e 1984.

A mostra reúne também livros, documentos e um mapa detalhado da TI Yanomami no Brasil. Em cartaz até 7 de abril de 2019, a exposição retoma a trajetória da ativista e sua luta constante pela proteção de povos que, ainda hoje, permanecem em risco. Uma das maiores artistas vivas, Andujar rompeu os limites entre arte e política para não abrir mão de seu compromisso ético com a vida. “Estou ligada ao índio, à terra, à luta primária. Tudo isso me comove profundamente. Tudo parece essencial. Talvez sempre procurei a resposta à razão da vida nessa essencialidade. E fui levada para lá, na mata amazônica, por isso. Foi instintivo. À procura de me encontrar”, afirma a artista.

Na abertura da exposição, será lançado um catálogo retrospectivo com mais de 300 imagens e textos do curador, de Andujar e do antropólogo Bruce Albert, que se aliou a ela na luta pelos Yanomami.

A mostra "Claudia Andujar – A luta Yanomami" será exibida no IMS Rio, a partir de julho de 2019. Esta exposição dá sequência à pesquisa realizada para a mostra "Claudia Andujar – O lugar do outro" (IMS Rio, 2015), também com curadoria de Thyago Nogueira, que apresentou a primeira parte da carreira da fotógrafa.

Serviço

Claudia Andujar – A luta Yanomami

Abertura: 15 de dezembro, às 11h
Visitação: até 7 de abril de 2019
Entrada gratuita
Galerias 2 e 3
IMS Paulista

Conversa de abertura, com Claudia Andujar, Thyago Nogueira e Davi Kopenawa
15 de dezembro, às 11h
Cineteatro do IMS Paulista
Entrada gratuita, com distribuição de senhas 1 hora antes e limite de 1 senha por pessoa

Pajelança com Davi Kopenawa, Pedrinho Yanomami e Levi Malamahi Alaopeteri Yanomami
16 de dezembro, às 11h
Galeria 3 do IMS Paulista
Entrada gratuita, sujeita a lotação, com lugares limitados

ISA
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