Projeto em tramitação no Senado pode deixar mais de 3 mil áreas protegidas vulneráveis, acelerar o desmatamento e empurrar o país para o colapso climático

O Instituto Socioambiental (ISA) publicou nesta segunda-fera (19/05) uma Nota Técnica sobre os impactos catastróficos do Projeto de Lei nº 2.159/2021, que tramita no Senado e propõe a criação de uma nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Já aprovado pela Câmara dos Deputados, o texto representa uma ameaça direta à integridade de mais de 3 mil áreas protegidas, incluindo Terras Indígenas (TIs), Territórios Quilombolas (TQs) e Unidades de Conservação (UCs). Se aprovado, o projeto pode causar um dos maiores retrocessos ambientais da história recente do Brasil.
De acordo com o documento, o PL “apaga” da legislação, para efeitos de licenciamento, 259 Terras Indígenas — ou quase um terço de todas as TIs existentes — e mais de 1,5 mil territórios quilombolas (cerca de 80% dessas áreas) completamente vulneráveis à ação de empreendimentos que, até então, precisavam respeitar regras ambientais mínimas. "Esses territórios, para efeitos do licenciamento, simplesmente deixarão de existir", alerta a Nota Técnica — uma violação direta dos direitos constitucionais dos povos tradicionais.
O projeto também encurta drasticamente o raio de avaliação de impactos ambientais, para efeito do licenciamento de obras e empreendimentos, permitindo que efeitos indiretos, como o desmatamento, a degradação de bacias hidrográficas, a fragmentação de habitats e o deslocamento de comunidades inteiras, sejam ignorados. Além disso, o texto elimina a exigência de consulta e autorização de órgãos ambientais responsáveis por Unidades de Conservação, desmontando um sistema que levou décadas para ser construído.
"Mexer no licenciamento ambiental é mexer em toda a base de sustentação ecológica do país", alerta Antonio Oviedo, um dos pesquisadores do ISA responsáveis pelo estudo. “Ao enfraquecer esse instrumento, o Brasil estará pavimentando o caminho para mais desastres socioambientais, perda de vidas, e o agravamento da crise climática.”
Um estudo de caso presente na Nota Técnica evidencia o tamanho do risco: considerando um conjunto de 75 obras previstas no PAC 2023 para a Amazônia Legal, 277 áreas protegidas seriam impactadas sob as regras atuais. Com o PL em vigor, esse número despenca para apenas 102, desprotegendo cerca de 18 milhões de hectares de floresta — o equivalente ao território do Paraná — e abrindo espaço para um ciclo de destruição irreversível.

O projeto também afrouxa ou elimina completamente as condicionantes ambientais, que obrigam empreendedores a adotar medidas de prevenção, mitigação e compensação. Especialistas alertam que essa brecha estimula o avanço do desmatamento ilegal, grilagem e violência no campo, ao mesmo tempo em que enfraquece os mecanismos de fiscalização.
Para além dos danos ambientais e sociais, o PL também sabota a segurança jurídica e financeira dos próprios empreendimentos. Ao excluir territórios ainda em processo de regularização do licenciamento, os impactos continuarão a acontecer — sem previsão legal de medidas compensatórias —, o que deve aumentar a judicialização e gerar custos inesperados bilionários a longo prazo.
A conclusão da Nota Técnica é clara: o projeto de lei representa um colapso anunciado. Se aprovado, o Brasil não apenas perderá milhões de hectares de floresta nativa, mas também comprometerá sua credibilidade internacional, violará direitos fundamentais e destruirá qualquer possibilidade de atingir as metas climáticas que assumiu diante do mundo.