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Povos do Rio Negro começam a definir como querem ser consultados

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Juliana Radler

Na Casa dos Saberes, em São Gabriel da Cachoeira (AM) 100 lideranças indígenas do Rio Negro deram pontapé para estabelecer um Protocolo de Consulta para a região

Entre os dias 19 e 21 de agosto, cerca de 100 lideranças indígenas das cinco regiões da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn)– Baixo e Médio Rio Negro; Alto Rio Negro e Xié; Içana; Baixo Uaupés e Tiquié e Médio e Alto Uaupés – se reuniram para debater sobre Protocolos de Consulta Prévia e traçar um plano de trabalho para a elaboração de um documento para os povos indígenas do Rio Negro.

O ato de consultar tradicionalmente faz parte do manejo do território, como por exemplo em pescarias ou migrações entre comunidades, e é também parte central no modo pelo qual o movimento indígena constrói sua representatividade. “Consultar as bases” é praxe e orienta as atividades da Foirn e de seus parceiros. Como lembrado por Justino Sarmento, do povo Tuyuka: “Desde que a Foirn surgiu a gente vem fazendo diferentes formas de consulta.”

Com apoio de assessoria jurídica, o evento levantou discussões sobre o direito à consulta prévia, livre, informada e de boa fé. De acordo com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, incorporada ao ordenamento jurídico nacional por meio do decreto n.º 5.051 de 2004, os povos indígenas devem ser consultados “mediante procedimentos apropriados e, particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente”. Ou seja, o Estado tem o dever de consultar de maneira adequada as instituições representativas dos povos indígenas no caso de empreendimentos a serem implementados em seus territórios e de políticas e legislações que os afetem direta ou indiretamente.

Formas de consulta

Para além dessa consulta que deve ser realizada pelo Estado, são diversas as circunstâncias onde se faz necessário respeitar os processos internos de consulta e estruturas tradicionais de decisão, como nos casos de presença de missionários, parcerias com pesquisadores, projetos comunitários e entrada nas Terras Indígenas. “Estas consultas devem contribuir para o nosso bem viver, proteger nossos interesses e nossa decisão na consulta tem que ser vinculante” afirmou André Fernando, liderança Baniwa.

Com participação de Wareuadju, liderança da Associação da Terra Indígena do Xingu, foi exposto o processo de construção do Protocolo de Consulta dos Povos do Território Indígena do Xingu que, guardadas as especificidades, compartilha com o Rio Negro o plurilinguismo e a diversidade de etnias. Wareuadju destacou a importância de se trabalhar para se chegar a um consenso entre as diferentes etnias e entender as ideias e anseios de cada uma para o protocolo. Foi também exibido o Protocolo dos Kayapó-Menkrãgnoti para incentivar as discussões em grupos de trabalho, organizados de acordo com as cinco coordenadorias regionais da Foirn.

Estes grupos de trabalho indicaram as respectivas áreas de abrangência, suas formas de organização e representatividade tradicionais e maneiras de tomadas de decisão. Com 40 anos de movimento indígena organizado, a região do Rio Negro conta com cerca de 90 associações de base e a Foirn é uma referência de união representativa dos 23 povos que habitam a região.

Os grupos ainda planejaram as etapas regionais para a construção do Protocolo de Consulta. Estas etapas têm o objetivo de trazer as especificidades de cada regional, debater sobre como fazer a consulta, quando, e com quem fazer. Ou seja, subsidiar um protocolo “guarda chuva” do Rio Negro, com um olhar mais próximo para cada regional. No total, foram previstos oito eventos - um para este ano e o restante para 2020. O primeiro acontecerá entre 26 e 29 de novembro na comunidade de Matapi, no Rio Uaupés.




A plenária assinou ainda uma carta que atesta o longo trabalho de representatividade da Foirn e alerta para os riscos de lideranças autoproclamadas que não discutem suas intenções nas instâncias de deliberação do movimento indígena. O documento foi assinado por cerca de 80 lideranças e teve destaque no principal jornal do Amazonas com a publicação da reportagem ao lado.

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