Presidente Lula decretou a oficialização definitiva de três áreas, em Minas Gerais e Sergipe. Novo programa prevê ações para regularização fundiária, infraestrutura, economia e desenvolvimento locais

Com informações da Agência Brasil
O governo voltou a titular territórios quilombolas, após quatro anos de paralisação dos processos de regularização dessas áreas pela administração de Jair Bolsonaro. A última dessas medidas em âmbito federal aconteceu em 2019, e imposta por decisão judicial.
O presidente Luís Inácio Lula da Silva assinou os decretos de titulação de três áreas, somando 3,1 mil hectares: 2,2 mil hectares, na comunidade de Brejo dos Crioulos, nos municípios de São João da Ponte, Verdelândia e Varzelândia (MG); 806 hectares, na comunidade de Serra da Guia, em Poço Redondo (SE); e outros 111 hectares, na comunidade de Lagoa dos Campinhos, entre Amparo de São Francisco e Telha (SE). Os beneficiados aguardaram pelos títulos por mais de 10 anos. Um hectare corresponde, mais ou menos, a um campo de futebol.
O governo também lançou o programa Aquilomba Brasil, com previsão de ações de regularização fundiária; infraestrutura e qualidade de vida; inclusão produtiva; etnodesenvolvimento local; e direitos e cidadania. As medidas foram anunciadas, na terça (21), no Palácio do Planalto.
Denildo Rodrigues, o Biko, da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), explica que a expectativa era de que o governo avançasse na conclusão de 39 processos de regularização de territórios que estão parados, aguardando apenas a assinatura dos decretos de titulação.
Ele ressalva, no entanto, que as ações anunciadas são um primeiro passo importante, considerando a paralisação das políticas quilombolas, iniciada há seis anos, no governo Temer. Biko diz que o movimento social vai cobrar do governo mais titulações e os recursos necessários para elas.
“Já é uma esperança esses três territórios titulados. Já mostra sinal de mudança e de retorno da pauta quilombola ao centro principal do governo, de onde nunca deveria ter saído. Então, para nós é importante”, afirma. Ele também vê com esperança a criação do Aquilomba Brasil. “Não é só a garantia do território em si. Mas [esperamos], sim, que o governo possa fazer um plano de regularização fundiária e de desenvolvimento desses territórios”, conclui.
'Agenda de titulação'
“A partir do programa Aquilomba Brasil, no eixo acesso à terra, vamos organizar, junto com o Incra, uma agenda nacional de titulação, que começa com os títulos entregues hoje pelo nosso presidente", informou a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, no evento de terça.
“O título que [essas comunidades] receberão hoje simboliza os novos tempos, não só para esses territórios, mas para muitos outros, que este governo se compromete a avançar na garantia do direito à terra, à reparação e à promoção da dignidade para a população quilombola", apontou.
A ministra contou que o Aquilomba Brasil pretende garantir, entre outras iniciativas, a permanência de estudantes quilombolas no ensino superior, com a ampliação de cotas nas universidades; reconhecer a medicina tradicional quilombola e expandir a presença de unidades básicas de saúde, principalmente no territórios mais isolados; retomar os programas Luz para Todos e de habitação rural para essas populações. Ainda não há informações sobre um plano e prazos para o início das ações.
Na terça, também foi anunciada a criação de um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) sobre o Cais do Valongo, que é patrimônio histórico da humanidade. O objetivo é articular ações para a área portuária do Rio de Janeiro, por onde passaram mais de um milhão de escravizados. Já há previsão para construção de um centro de referência de herança africana no local.
A data do anúncio das medidas (21/3) foi escolhida para celebrar os 20 anos das políticas de igualdade racial no país, desde a criação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, em 2003, no primeiro mandato de Lula. Também por ser o Dia Internacional da Luta pela Eliminação da Discriminação Racial e o Dia Nacional das Tradições de Raízes de Matrizes Africanas e Nações de Candomblé, instituído por lei sancionada pela atual gestão, em janeiro.
Pacote antirracismo
“Apesar de ocupar o posto da segunda maior nação negra no planeta, o Brasil ainda não acertou as contas com o passado de 350 anos de escravidão. Apesar de todos os esforços e avanços, esse país ainda tem uma imensa dívida histórica a resgatar”, pontuou Lula. “Com as cinco ações de hoje, voltamos a responder concretamente a bandeiras históricas do movimento negro”, defendeu.
Ele também assinou os decretos de criação de outros GTIs para formular ações e programas de promoção da igualdade racial. Um deles vai discutir a estrutura do Programa Nacional de Ações Afirmativas, prevendo medidas para o acesso e permanência de estudantes negros nas universidades, além de reservas de vagas em órgãos governamentais.
Outro GTI vai discutir o Plano Juventude Negra Viva, com iniciativas para a redução de homicídios, vulnerabilidades e desigualdades sociais para jovens negros de 15 a 29 anos. O último GTI vai elaborar medidas de enfrentamento ao racismo religioso, que afeta povos e comunidades tradicionais de matriz africana e de terreiros.
Quantos são os quilombolas no Brasil?
Ainda não há uma estimativa oficial, mas o IBGE calcula que existam, hoje no país, cerca de 214 mil famílias quilombolas, num total de aproximadamente 1 milhão de pessoas, em seis mil comunidades e 1,6 mil municípios. O Censo ainda em andamento no país vai trazer informações inéditas sobre essas populações e territórios.
Até hoje, já foram expedidos pelos governos federal e estaduais 315 títulos, em 205 territórios, 355 comunidades, abrangendo 20,7 mil famílias e cerca de um milhão de hectares. Os dados são do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e deste mês.