Sônia Guajajara precisará de habilidade para compor uma equipe que possa dar rumos ancestrais a uma estrutura antiga que ainda teima em reinar
Tomou posse no dia 11 de janeiro a ministra do recém-criado Ministério dos Povos Indígenas (MPI), Sônia Guajajara. Esse acontecimento marca uma nova fase do governo que, durante a campanha, havia prometido a criação de um ministério que dialogasse diretamente com os povos originários. No evento, foi empossada também a ministra do Ministério da Igualdade Racial, Anielle Franco.
O atual momento marca um tempo de diferentes responsabilidades, como para o Estado, que tem seus interesses mais pautados historicamente no que tange o progresso na perspectiva hegemônica colonizadora em contraposição à garantia de direitos das populações originárias, principalmente o territorial.
Mas também trata-se de um momento de reconstrução, não apenas material, do rastro deixado pelos simpatizantes do governo anterior, mas de um olhar mais sensível à diversidade, aos que historicamente foram desrespeitados pelo Estado, bem como ao avanço do desmatamento e do garimpo ilegal na Amazônia.
Agora, o governo passa a ter uma representação indígena, formada por todo um corpo de funcionários indígenas e não-indígenas compondo sua estrutura, e não mais somente com autarquias que atuavam diretamente com os parentes nas aldeias.
Essa mudança de perspectiva pode dar aos povos indígenas um olhar mais amplo às conhecidas limitações burocráticas que sempre assombraram o manejo do dia a dia.
Também pode permitir que as demandas mais urgentes sejam atendidas e também que a composição de políticas públicas realmente alcance os objetivos das populações indígenas.
Vemos essa tendência em alguns países da América Latina atualmente, em grande parte graças à luta e à resiliência desses povos.
O momento coincide também com o aumento do acesso das populações tradicionais às redes sociais, cinema e artes. Ou seja, traz à tona algo que acaba se tornando símbolo de uma saída do conceito mais hegemônico.
Essa difusão acabou atraindo olhares e reflexões de como os nativos originários podem propor composições mais diversas para o modelo monocultural vigente desde o tempo do iluminismo europeu.
O momento é de transformação, reconstrução e autonomia que estão presentes em nosso continente e no Brasil. Sônia Guajajara precisará de habilidade para compor uma equipe que possa dar rumos ancestrais a uma estrutura antiga que ainda teima em reinar.
* Gilmar Terena e cineasta indígena e integrante da equipe do ISA em Brasília