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Hidrelétricas da Amazônia na berlinda

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Indígenas, ribeirinhos, ambientalistas e pesquisadores voltaram a criticar a opção pelas grandes obras para gerar energia. ISA é um dos parceiros de evento na Câmara
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Seminário realizado, ontem (6/12), na Câmara dos Deputados, discutiu os impactos das grandes hidrelétricas na Amazônia e alternativas sustentáveis de geração de energia para o país. O evento reuniu representantes do governo, parlamentares, pesquisadores e organizações da sociedade civil. O ISA foi um dos parceiros (saiba mais).

O debate contou com a presença de indígenas e ribeirinhos que relataram as consequências do descumprimento da legislação ambiental na implantação das obras, em especial casos concretos de violações de direitos.

“Nossa região está esquecida por esses grandes deputados e governo. A gente vê que nosso rio está acabando, não estamos mais conseguindo pegar peixe para nossa sobrevivência. Está acabando com a nossa cultura”, denunciou Giliarde Juruna, da Terra Indígena Paquiçamba, duramente impactada pela implantação da usina de Belo Monte (PA).


“Das 40 hidrelétricas previstas no Plano Decenal de Energia [na Amazônia], todas elas atingem ou populações indígenas, ou populações quilombolas, ou populações tradicionais de modo geral”, alertou Felício Pontes, procurador da República. Ele lembrou que a construção das usinas tem de ser precedida por consulta prévia às comunidades indígenas e tradições como condição para sua realização.

“A postura do ministro [de Meio Ambiente, Sarney Filho] e a postura do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente] em relação à questão das hidrelétricas na Amazônia, especificamente, é que temos de analisar não só as alternativas locacionais, mas alternativas de fontes de geração”, afirmou Suely Araújo, presidente do órgão ambiental.

Ela prometeu fiscalização constante sobre as condicionantes do licenciamento de Belo Monte. Várias deveriam ter sido cumpridas antes do projeto sair do papel e avançar. O ISA publicou, na semana passada, relato sobre a situação das comunidades atingidas pela usina (confira).

O tema das energias renováveis alternativas, como eólica e solar, também causou polêmica no seminário.

“Energias renováveis não hídricas têm um grande problema: elas são intermitentes. Sol só tem de dia, vento nem todo tempo. Por isso, a gente tem que ter uma energia firme na base que suporte essas fontes renováveis. Certamente teremos que passar por hidrelétricas”, declarou Eduardo Azevedo, secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia (MME).

Danicley de Aguiar, do Greenpeace, contrapôs que hoje já existe a tecnologia para uma transição energética que permita reduzir o uso das hidrelétricas. “A revolução energética já chegou. É uma realidade, é irreversível. O debate hoje é mais político do que técnico”, analisou. “Acreditamos que é possível descarbonizar a geração de energia até 2050 sem construir mais nenhuma hidrelétrica na Amazônia”, afirmou.

Polêmica de São Luiz do Tapajós

A hidrelétrica de São Luiz do Tapajós (PA) foi outro alvo de críticas. No seminário, Suely Araújo disse que pedido de licenciamento da obra não foi recusado, mas arquivado. Segundo a decisão, de agosto, complementações ao Estudo de Impacto Ambiental não foram apresentadas pelo empreendedor e a presença de comunidades indígenas impede a implantação da obra, conforme parecer da Fundação Nacional do Índio (Funai).

“O arquivamento não impede a apresentação de novo projeto, só que vai permanecer o parecer conclusivo da Funai, e o Ibama respeita pareceres conclusivos da Funai”, esclareceu Araújo, em entrevista ao ISA. “Eles [empreendedores] têm de recomeçar do zero, a gente não pode se negar a analisar, porque ele só foi arquivado, mas vai permanecer o impeditivo da Funai, que considera a obra inviável”, acrescenta.

O presidente da Eletrobras, Wilson Ferreira Jr., disse, na semana passada, que a empresa mantém os planos de explorar o Rio Tapajós. A Eletrobras é uma das empresas responsáveis pelo empreendimento.

Empréstimos para hidrelétricas

O financiamento às hidrelétricas, com foco na atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), tomou boa parte do debate. Foram feitas várias críticas aos empréstimos bilionários feitos pelo banco à Belo Monte e outras grandes obras – apesar do descumprimento das condicionantes definidas no licenciamento ambiental e das violações de direitos de indígenas e ribeirinhos.

“O que a gente vê é que as empresas são soberanas. O BNDES fica lá atrás só passando dinheiro”, criticou Antônia Melo, coordenadora do Movimento Xingu Vivo Para Sempre (MXVPS).

“O BNDES é corresponsável pelos impactos de Belo Monte porque continuou financiando a obra mesmo após as repetidas multas impostas pelo Ibama ao empreendedor, comprovando a inadimplência com as obrigações socioambientais”, avalia Ciro Campos, assessor do ISA.

De acordo com Philip Fearnside, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), o BNDES não levou em conta riscos importantes ao financiar a hidrelétrica. “Não incluíram os efeitos de mudanças climáticas, que preveem grande diminuição na vazão de água e produção de energia nem o efeito de mais desmatamento na bacia hidrográfica. Há estudos que mostram que estes efeitos somados causam uma redução da produção de energia”, analisa.

Belo Monte foi construída por três empreiteiras citadas na Operação Lava Jato: Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez. Depoimento de executivos da Andrade Gutierrez indicam que R$ 150 milhões foram pagos em propina na obra.

Impactos de Belo Monte na tela

O documentário “Belo Monte: depois da inundação” foi lançado na segunda (05/12), em Brasília. O evento também contou com a presença de lideranças indígenas e de ribeirinhos da região afetada pela usina. O filme retrata os impactos sobre populações e o meio ambiente da obra. O documentário também expõe as mobilizações dessas populações para denunciar as violações de seus direitos, em Altamira (PA). Especialistas e representantes de organizações da sociedade civil, incluindo o ISA, também marcaram presença no lançamento, que contou com um debate.

“Se Maomé não vai até a montanha, a montanha vai até Maomé. Então nós vamos levar Belo Monte para o conhecimento de todos”, disse Todd Southgate, direto do documentário.

“Vendo esse filme de volta, eu relembro tudo o que eu passei. Mas a gente nunca deve desistir. Nós somos fortes, nós jamais desistimos e não vamos desistir da luta”, disse Raimunda Silva, moradora de Altamira, após a exibição. Ela é uma das personagens retratadas no documentário e luta ativamente pelos direitos dos impactados pela obra.

Acesse o site do documentário “Belo Monte: Depois da inundação

Victor Pires
ISA
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